Os golpistas no mundo cripto: análise do milionário negócio dos "rug pulls"

No ecossistema das criptomoedas, a tecnologia blockchain foi desenhada para oferecer empoderamento financeiro e acesso a serviços bancários a pessoas excluídas do sistema tradicional. No entanto, esta mesma tecnologia tornou-se um terreno fértil para fraudes sofisticadas que estão gerando perdas milionárias a investidores suckers.

A anatomia do "rug pull": a fraude perfeita

Um recente documentário da jornalista Mariana van Zeller expõe o lado obscuro do boom das criptomoedas, focando em uma modalidade de fraude particularmente devastadora: o "rug pull". Este esquema, tão simples quanto implacável, está destruindo patrimónios inteiros.

"Cada vez que surge algo que aparentemente permite ganhar grandes quantidades de dinheiro rapidamente, aparecem pessoas dispostas a explorar esses sonhos e esperanças", explica Mariana na sua investigação.

O mecanismo destes fraudes segue um padrão identificável: os golpistas criam um token digital, carregam-no inicialmente a preços muito baixos e depois orquestram campanhas agressivas de promoção através de redes sociais como X, Telegram, Reddit e YouTube. Utilizam promotores pagos para inflar artificialmente o preço do ativo. Quando suficientes investidores adquiriram o token acreditando no seu potencial, os criadores liquidam as suas posições e desaparecem, provocando o colapso total do valor e deixando os investidores com ativos digitais sem valor algum.

De acordo com dados do FBI, atualmente os "rug pulls" representam aproximadamente 37% das receitas ilícitas no setor de criptomoedas, tornando-se uma das modalidades de fraude mais lucrativas do ecossistema digital.

Casos documentados: perdas milionárias

Os registos oficiais do Departamento de Proteção e Inovação Financeira da Califórnia mostram um panorama alarmante, com 372 entradas documentadas de atividades fraudulentas relacionadas com criptoativos.

Entre os casos mais graves, destaca-se o de um homem de 68 anos que perdeu mais de $565,000 depois de uma transação de uma plataforma de troca para a sua conta bancária ter desaparecido sem deixar rasto.

Outro caso representativo envolve um investidor que foi contactado através do WhatsApp e atraído para uma plataforma falsa chamada Goomarket LLC. A vítima foi manipulada para acreditar que havia ganhado $5.3 milhões, mas quando tentou retirar os fundos, os golpistas exigiram o pagamento de supostos impostos. Após cumprir com esse primeiro pagamento, seguiram novas exigências relacionadas com autorizações contra lavagem de dinheiro. Finalmente, depois de ter transferido $540,000, a vítima descobriu o engano quando a plataforma desapareceu completamente.

A psicologia do golpista: ausência total de empatia

Um dos aspectos mais inquietantes revelados no documentário de van Zeller é a mentalidade daqueles que perpetraram essas fraudes. Numa entrevista com três golpistas que mantiveram o anonimato, um deles, identificado como "Mr. X", descreve sem remorsos os rug pulls como uma "maneira legal de roubar" e afirma com frieza: "Você só tem que conseguir. Não nos importa."

Quando a jornalista confronta este golpista sobre as devastadoras consequências das suas ações —pessoas que perderam as poupanças de uma vida inteira, casas, fundos de reforma e até casos que terminaram em suicídio—, a resposta é arrepiante:

"Se você vai investir suas economias de uma vida inteira em uma moeda, deveria levar cinco minutos para fazer uma pesquisa no Google... são as pessoas mais estúpidas do mundo", sentencia Mr. X.

Esta declaração revela a essência da economia moderna da fraude digital: operadores insensíveis, extremamente seguros de si mesmos e completamente desprovidos de empatia para com as suas vítimas.

O contexto atual: riscos crescentes num mercado em alta

De acordo com a análise do fundo índice Bitwise, o quarto trimestre de 2024 pode ser lembrado como "um dos mais importantes na história das criptomoedas". Paradoxalmente, os períodos de maior otimismo e crescimento no mercado também representam momentos de máximo risco para os investidores.

Como aponta John Wilson, especialista em segurança da plataforma Forta, "os golpistas e criadores de esquemas de phishing são oportunistas por natureza" que aproveitam precisamente os momentos de maior entusiasmo dos investidores para executar os seus enganos.

Neste ambiente, a capacidade de identificar sinais de alerta e realizar a devida diligência sobre os projetos torna-se crucial para proteger os ativos digitais, especialmente quando o mercado passa por fases de euforia que podem ofuscar o julgamento dos investidores menos experientes.